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O mito do colesterol

Como? As gorduras saturadas e o colesterol fazem bem à saúde? É uma versão. Não oficial.

Por: Bárbara Bettencourt
03 Maio 2013, às 14:55

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Durante anos ouvimos que o colesterol é a encarnação do mal. Que em excesso entope as artérias e abre caminho aos enfartes do miocárdio e aos AVCs. Por causa dele passámos a olhar com horror para as alheiras, para as bifanas e para a manteiga. Os ovos passaram a merecer desconfiança. Não mais de um ou dois por semana disseram-nos repetidamente. Para manter o colesterol em níveis aceitáveis, milhões de pessoas tomam regularmente medicamentos conhecidos como estatinas. São os medicamentos mais vendidos em todo o mundo e Portugal não é exceção: em 2000 vendiam-se perto de um milhão e 500 mil embalagens. Em 2009 mais de cinco milhões e 400 mil, um aumento de mais de 200% lê-se numa tese de mestrado que fez a avaliação do consumo destas substâncias em Portugal.

Pois bem, todas estas ‘provações’ podem ser em vão. Pelo menos a crer nos ‘céticos do colesterol’, um grupo de médicos e investigadores empenhados em acabar com o que garantem ser a crença errada de que o colesterol faz mal à saúde. (ver entrevista). Existe, desde 2003, uma Liga internacional dos Céticos do Colesterol (www.thincs.org) com uma centena de membros das mais diversas especialidades médicas. São vistos como fanáticos ou adeptos de teorias da conspiração pelos médicos ‘ortodoxos’, mas a sua cruzada ganhou visibilidade nos últimos meses com a publicação em França do livro ‘La Verité sur le Cholestérol’, do médico Philippe Even, e, nos EUA, do livro ‘The Great Cholesterol Myth’, do cardiologista Stephen Sinatra e do nutricionista Jonny Bowden. O apoio mediático do médico Mehmet Oz que entrevistou os autores no seu programa de televisão visto por milhões voltou a criar um buzz à volta do tema. As doenças cardiovasculares são a principal causa de morte em todo o mundo. Em Portugal, segundo o INE, foram responsáveis por 31,9 por cento das mortes em 2009. Os fatores de risco incluem a hipertensão, obesidade, diabetes. E também o colesterol elevado, que os céticos querem reabilitar.

O que é o colesterol?

É um esterol, uma espécie de álcool, produzido pelo fígado, e que se encontra nas membranas celulares em todos os animais. Integra os tecidos do cérebro, coração, fígado e rins. É necessário para sintetizar a vitamina D, os ácidos biliares, que digerem as gorduras, e várias hormonas. O leite materno tem altos níveis de colesterol e sabe-se que deficiências no metabolismo do colesterol causam atraso mental. Como não é solúvel no sangue, o colesterol é transportado numa lipoproteína. Chamamos LDL, ou mau colesterol, à lipoproteína que transporta o colesterol do fígado, até aos tecidos e sangue e apelidamos de HDL , ou bom colesterol, à lipoproteína que traz o colesterol dos tecidos e artérias de volta para o fígado, onde é reciclado para ser usado novamente, explica Nina Planck no livro ‘Real Food - what to eat and why’.



O que dizem os céticos?

Um relatório da Escola de Saúde Pública de Harvard aponta o metabolismo, mais do que a dieta, como responsável pelos níveis de colesterol no sangue. Esta ideia reúne consenso na classe médica. Pedro Marques Silva, responsável da Consulta de Hipertensão Arterial e Dislipidemias do Hospital de Santa Marta, em Lisboa, confirma: “Se reduzíssemos o colesterol na dieta de tal maneira que a comida ficasse incomestível, ainda assim a taxa de colesterol que conseguíamos reduzir seria apenas de 20%”. É por isso que vegans e vegetarianos podem ter níveis de colesterol altos apesar de não comerem produtos animais. E é com este argumento que os céticos incentivam o regresso das gorduras saturadas (presentes em alimentos de origem animal como a manteiga e carne vermelha e também no óleo de coco) ao prato. Além de não influenciarem o colesterol no sangue, elas têm um papel importante na absorção do cálcio e manutenção da densidade óssea e são essenciais para o funcionamento do cérebro e do sistema nervoso, dizem.

Quer dizer que podemos ingerir colesterol à vontade? A nutricionista Ana Carvalhas não vai tão longe: “Uma pessoa magra, com colesterol total (CT) elevado, mas sem hipertensão ou diabetes, não tem risco cardiovascular, teoria defendida pelos céticos do colesterol, que eu partilho. Nestes casos, a alimentação não é um fator decisivo, nem vale a pena andar a fazer restrições radicais ou medicação. O problema é que na maioria dos casos, quem tem o CT aumentado tem também outros fatores de risco, como o excesso de peso, a hipertensão ou a diabetes. É o que chamamos de síndrome metabólica. Quando é assim, a alimentação é fundamental, porque o simples facto de perder peso ajuda muito. Tenho casos de pessoas que deixaram a medicação para a hipertensão e para o colesterol com base na reeducação alimentar e no exercício (uma caminhada diária de 60 minutos)”.

Ana Carvalhas também subscreve os céticos do colesterol na opinião de que os verdadeiros inimigos do coração são as gorduras hidrogenadas, ou trans, presentes nos alimentos processados para ajudar a prolongar o seu tempo de prateleira, e o açúcar. Até porque “a alimentação pode não influenciar o colesterol mas influencia o nível de triglicéridos, outro tipo de gordura do sangue, associada sobretudo ao consumo de açúcar simples e de hidratos de carbono, e que é consensualmente um fator de risco para as doenças cardiovasculares e diabetes”.

Não existe uma relação direta entre o colesterol no sangue e as doenças coronárias, dizem os céticos do colesterol. O francês Philippe Even, autor do livro ‘La Verité sur le Cholestérol’, enfatiza que analisou mais de 800 publicações científicas, em particular oito estudos epidemiológicos, dez meta-análises e 46 ensaios clínicos concluindo que não é verdade que a responsabilidade do colesterol esteja apoiada em provas sólidas e largamente aceites ou que numerosos estudos tenham mostrado uma relação direta entre o colesterol e a mortalidade cardíaca. O cardiologista norte-americano Jonny Bowden, autor do livro ‘The Great Cholesterol Myth’, subscreve. “Durante 43 anos fiz prática clínica com base nos dados convencionais, mas a certa altura dei-me conta que se metade das pessoas com colesterol alto tinha doenças cardíacas e outra metade não, alguma coisa estava errada na associação de causa-efeito do colesterol às doenças cardíacas”, explicou o cardiologista, no programa te TV do Dr. Oz.

Para os céticos do colesterol, a presença de colesterol nas artérias de doentes coronários decorre muitas vezes de uma função pouco conhecida do próprio colesterol: a de molécula reparadora. “Na verdade, ele tem uma função é protetora. Quando as artérias estão danificadas o colesterol LDL viaja até ao local do acidente e ajuda a repará-las. Culpar o colesterol é como culpar os bombeiros de atearem fogos”.

Em Portugal não é fácil encontrar quem subscreva estas ideias. Pedro Marques Silva, do Hospital de Santa Marta chama-lhes teorias da conspiração e enfatiza a correlação entre o colesterol e as doenças coronárias: “Nem todos os eventos cardiovasculares têm relação direta com o colesterol, há outros fatores de risco mas pessoas com colesterol alto têm uma probabilidade de ter um evento cardiovascular muito maior do que as que não têm. Ainda assim, admite que, as teorias possam vir a ser revistas: “Claro que as teorias são revistas. Quando eu me formei não se falava praticamente do colesterol e ainda há pouco tempo veio um artigo discutir o papel da obesidade como fator de risco tão prevalente e até foi admitido que um certo valor de gordurinha seria benéfico”.

A nutricionista Ana Carvalhas assume que os mecanismos fisiológicos implicados na regulação do colesterol sanguíneo são complexos e atualmente ainda se dominam pouco. “Falta provar com consistência a hipótese lipídica, até hoje a mais aceite, que considera o elevado consumo de gorduras saturadas e os elevados níveis de LDL-colesterol como as causas mais importantes da aterosclerose e da doença coronária. Estou atenta à discussão entre os intervenientes das duas fações, mas para mim faz cada vez mais sentido a teoria defendida pelos céticos do colesterol”.

Recomendações oficiais para o colesterol

- 190mg/dl no máximo para o colesterol total

- 115mg/dl no máximo para o colesterol LDL (mau).

- Acima de 35mg/dl para o colesterol HDL (bom)



Combater a inflamação

As doenças cardíacas eram raras até 1900. Hoje são a principal causa de morte no Ocidente. Para os céticos do colesterol a explicação está na alimentação que passou a ser cada vez mais processada. Açúcar e gorduras trans provocam um processo inflamatório que está na origem do entupimento das artérias, defende o cardiologista Jonny Bowden. “Temos usado os números do colesterol para aferir o risco cardíaco e medicamentos como as estatinas como se nos ajudassem a viver mais. As estatinas são medicamentos anti-inflamatórios, que por acaso também baixam o colesterol, só que o colesterol não é a causa, apenas um sintoma, e as estatinas têm muitos efeitos secundários. Dos estudos que analisei, as estatinas funcionam bem apenas numa população: homens de meia-idade com historial de doença coronária, preferencialmente com baixo HDL colesterol. Para a generalidade da população, especialmente mulheres, idosos e crianças, elas não devem ser prescritas. O ensaio clínico Womens’s health initiative mostrou que 48% das mulheres em menopausa que tomaram estatinas ficaram com diabetes. Quanto às crianças, convém lembrar que o seu cérebro não está completamente desenvolvido até aos 25 anos e que precisamos de colesterol para a memória e para sintetizar as hormonas sexuais. A melhor prevenção para as doenças corronárias é baixar a inflamação através da dieta (comendo alimentos ricos em ácidos ómega 3, vitamina B6, acido fólico e vitamina b12) baixar o stress, apanhar sol e fazer exercício”.

Uma questão de tamanho

Durante anos também ouvimos falar do mau (LDL) e do bom colesterol (HDL), o primeiro sendo o mais perigoso. Mas há vários tipos de moléculas de LDL e neste caso o tamanho importa. O cirurgião cardiotorácico Mehmet Oz, explica que apenas as partículas pequenas e densas de LDL podem ser um problema, já que, na tentativa de reparar os danos nas artérias, conseguem aglomerar-se junto a pequenas lesões das artérias e causar inflamação. A subida dos níveis destas moléculas mais pequenas de LDL parece estar associada a dietas com altos teores de hidratos de carbono e pobres em gorduras. Ou seja, mesmo dando importância aos níveis de colesterol LDL, é possível reabilitar as gorduras saturadas, o que parece reabilitar a célebre dieta Atkins assim como a tão falada dieta Paleolítica, ambas ricas em proteínas e gorduras e pobres em hidratos de carbono. “A gordura saturada é saudável se consumirmos poucos hidratos de carbono, já que aumenta o colesterol bom e o LDL de partículas grandes, e baixa os triglicéridos. Além disso, a gordura saturada, tem um efeito saciante e ajuda a manter os níveis de glicemia estáveis.

Os ovos

Durante anos, ouvimos que mais do que um a dois ovos por semana era mais do que suficiente. Uma única unidade contém cerca de 213 mg, mais do que os 190mg/dl recomendados. Alguns estudos e muita pressão dos produtores vieram no entanto reabilitar os ovos para a dieta. Uma pequisa da Escola de saúde Pública de Harvard confirmou que comer um ovo por dia não aumenta o risco de ataque cardíaco ou derrame.

“47% das mortes na Europa devem-se às doenças cardiovasculares. Elas causam causam a morte de 4 milhões de pessoas por ano na Europa segundo a European Heart Network".

Numa análise da IMS Health feita por valor, em 2011, os medicamentos mais vendidos em Portugal, foram reguladores do colesterol.

Fonte: Bárbara Bettencourt /  Beleza,saúde e moda com 

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